sexta-feira, 30 de maio de 2014

A linguagem dos sentimentos e a Copa do Mundo

Por Barbosa Nunes
No sentido etimológico "sentimento" vem do latim "sentire", que significa perceber pelos sentidos. No sentido genérico designa o estado afetivo por algo, emoção superior. Leio no presente momento o livro "A Linguagem dos Sentimentos", do psiquiatra americano David Viscott, que viveu entre 1938 a 1996 "Summus Editorial". Encontrei na publicação que "nossos sentimentos são nosso sexto sentido, que interpreta, organiza e resume os outros cinco sentidos (audição, olfato, paladar, tato e visão). Os sentimentos nos dizem se o que estamos experimentando é ameaçador, doloroso, lamentável, triste ou alegre. Os sentimentos são nossa reação ao que percebemos e , por sua vez, eles colorem e definem nossa percepção do mundo. Na verdade, os sentimentos são o mundo em que vivemos". Em que mundo estamos vivendo no Brasil? Estamos todos, tristes e indignados, ou pelo menos a grande maioria, pois há uma minoria privilegiada alegre, que se beneficia com a situação do país. Baixa confiança da população nos poderes. Duvida-se da honestidade dos políticos, causada pelos acontecimentos revelados quase que semanalmente, o que aumenta o grau de descrença do eleitor, naqueles que elegeu para representá-lo. Partidos políticos, mais de 30, com programas que nada diferem um do outro. Seus tempos na televisão durante campanha eleitoral são disputadíssimos a peso de ouro. Impunidade. Violência. Sistema de saúde precário. Transporte público infernal e vergonhoso, submetendo o ser humano em especial as mulheres, a constrangimentos, humilhações e vexames. Boi, vaca e outros animais são transportados em incomparáveis melhores condições que um ser humano. Qual é o sentimento do povo brasileiro diante de uma copa do mundo e logo após uma eleição para os maiores cargos da nação? De preocupação, medo, descrença com uma perspectiva que não permite previsão positiva. As informações diárias pela mídia e as análises dos especialistas indicam perigo direto com os desdobramentos dos dois eventos. Pós-eleição, eleito quem for, medidas duras estão sendo antecipadas em comentários pelos analistas das áreas política e econômica. O cidadão vai tendo a sensação de que votar pode não adiantar quase nada, que a participação no pleito será inútil em ambiente de corrupção visível, invisível e refinada, praticada pelos que exercem o poder, causadores dos maiores desvios de nossa história, enfraquecendo a atividade social da nação. Aqui está o perigo de alta abstenção, pois o eleitor está descrente, desmotivado. Meu sentimento quanto à próxima eleição é de que a voz do povo já foi manifestada nas ruas, avenidas e praças. Ela precisa ser ouvida. É indispensável uma reforma política urgente, operacionalizada desde o primeiro dia do próximo governo, viabilizando outras reformas, sem o que, continuaremos aprofundando a crise política em que vivemos. A maior participação na eleição poderá ser mais uma oportunidade de agir em favor das mudanças necessárias, mas é preciso não ser repetidas as tradicionais promessas do horário eleitoral, cuja audiência tem sido menor em cada eleição. Vendem-se mirabolantes planos e soluções para todos os problemas, como se detentores de uma vara mágica. Chegamos a um ponto preocupante com manifestações inadmissíveis, violentas. Queima de ônibus, desrespeito ao patrimônio público, bloqueio nas rodovias e no transporte público, penalizando a população em geral e formando um ambiente que dificulta o bom debate, impossibilitando crescimento da consciência política brasileira. Muitos incentivam nos bastidores e até custeiam os organizadores desses movimentos. Outros querem ser vitoriosos nas eleições adotando o "quanto pior melhor", apostando no caos. Trago a oportuna reflexão do Arcebispo de Belo Horizonte, Dom Walmor Oliveira de Azevedo, sobre a Copa do Mundo com suas implicações políticas. Mantendo a distinção entre uma e outra, embora agregadas, pontua: "A Copa do Mundo deste ano pode se tornar um dos mais significativos momentos da história sociopolítica do Brasil. O discurso que se ouviu nas ruas, foi um sinal, obviamente com a recusa radical dos lamentáveis episódios de vandalismo, violência e atentados contra o patrimônio público. Historicamente, a sociedade brasileira sempre viveu o tempo da Copa do Mundo, simplesmente como momento de euforia e divertimento. Essa paixão esportiva nacional, com sua força educativa e o gosto que o futebol dá à vida dos torcedores, indica que é preciso conciliar euforia e divertimento com o viés político e social". Conclui que "os fantasmas e ameaças de vandalismo não podem atropelar a oportunidade cidadã de jogarmos pela vida. O coração apaixonado do torcedor, seu sentimento de pertença à pátria, tem agora a oportunidade de agregar entendimentos, discussões, análises e posturas que nos levem não só a vencer no esporte, mas, sobretudo contribuam para o crescimento da consciência cidadã. O cenário político, com a singularidade deste ano eleitoral, precisa ser iluminado pela atenção especial que uma Copa do Mundo mobiliza. Não permitir qualquer tipo de violência é de suma importância, para que manifestações, discussões e outras condutas cidadãs promovam mudanças nos abomináveis cenários de corrupção, exclusão social e desrespeito à dignidade da pessoa". A Copa do Mundo me traz gratas, inesquecíveis recordações. No sonho de minha adolescência em 1958, na minha querida cidade de Itauçu, vibrei ouvindo um dos maiores narradores do rádio brasileiro, Fiori Gigliotti, da Rádio Bandeirantes de São Paulo, partida após partida, até a última, quando o Brasil sagrou-se campeão na Suécia. E hoje? O que posso e devo transmitir aos meus netos Paulo Henrique de Oliveira Brandão e Vinicius Barbosa Puggina? Transmito sentimento de torcida contra o Brasil? Jamais! Na ilusão deles com 9 e 11 anos, devo incentivá-los a torcer como fiz quando criança, embora a eles ainda não haja consciência dos males que esta Copa do Mundo este provocando ao país. Apesar do país estar como se tivesse como presidente da República o senhor Joseph Blatter e como Primeiro Ministro o mal educado Jerome Valcke, apesar dos estádios superfaturados, da submissão aos ditames da FIFA, apesar da seleção ter 19 jogadores que atuam fora do país, estranhos para os torcedores infantis e adolescentes, que na maioria sabem apenas o nome de Neymar, apesar das declarações idiotas de Ronaldo, uma delas afirmando de que não se faz uma copa construindo hospitais, apesar de que até ao final da copa os 12 estádios terem sido entregues à FIFA, deixando de ser território administrado por ordens brasileiras, apesar da FIFA mandar em tudo, impondo a venda nos estádios da substância mais nociva, que é a droga álcool, embora tenhamos legislação proibitiva, devo lembrar que há oito anos atrás, 72% da população aprovou, festejou e vibrou com a decisão da copa vir para o Brasil. Muitos ganharão muito dinheiro, mas muitos perderão pelos investimentos que fizeram, pois já se acusa no comércio a venda pequena de produtos para a Copa e hotéis já noticiam que não haverá lotação superior a 70% dos leitos. Apesar da agressão mostrada pela televisão do quanto é luxuosa a Granja Comary, exagerada em sua reforma com doze milhões de reais e apesar de outras tantas coisas que vão tornando o brasileiro descrente e indignado com esta copa, vou torcer de corpo e alma para o êxito da nossa seleção, lá dentro de campo. Lamentavelmente estamos em clima morno, sem aquela sensação equivalente ao carnaval. Não posso compreender a torcida que contra a seleção, desejando resultados negativos. Para o Brasil será melhor que tenhamos bons resultados e sejamos campeões. Não merecemos mais tristezas. Não merecemos a repetição da tragédia de 1950, perdendo o título aqui em nosso país, na última partida, precisando de um empate, marcando o primeiro gol e no final, o Uruguai campeão, vencendo por 2 x 1. Meu sentimento me prepara e me indica reunir a família, amigos em casa e com os dois netos, torcer fervorosamente, gritando e comemorando cada gol, transmitindo a eles a mesma alegria que tive em 1958, marcada indelevelmente em minha memória, pois esta Copa do Mundo é para ser vista, lamentavelmente enclausurados. Mas estou comprando a seleção brasileira dentro do campo, por ela vou torcer, mas fora de campo, também estou descrente, triste e indignado, pois reafirmo no artigo que aqui escrevi anteriormente, ESTA COPA NÃO É DO BRASIL, É DA FIFA. (Barbosa Nunes, advogado, ex-radialista, membro da AGI, delegado de polícia aposentado, professor e maçom do Grande Oriente do Brasil)

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