Tradição e fé em Monte Alegre de Goiás

Por Nelli Gáspio

Nossa Senhora do Rosário (ou Nossa Senhora do Santo Rosário ou Nossa Senhora do Santíssimo Rosário) é o título recebido pela aparição mariana a São Domingos de Gusmão em 1208 na igreja de Prouille, em que Maria dá o rosário a ele, conforme informações retiradas da internet. Em agradecimento pela vitória da Batalha de Muret, Simon de Montfort construiu o primeiro santuário dedicado a Nossa Senhora da Vitória. Em 1572 Papa Pio V instituiu "Nossa Senhora da Vitória" como uma festa litúrgica para comemorar a vitória da Batalha de Lepanto. A vitória foi atribuída a Nossa Senhora por ter sido feita uma procissão do rosário naquele dia na Praça de São Pedro, em Roma, para o sucesso da missão da Liga Santa contra os turcos otomanos no oeste da Europa. Em 1573, Papa Gregório XIII mudou o título da comemoração para "Festa do Santo Rosário" e esta festa foi estendida peloPapa Clemente XII à Católica. Após as reformas do Concílio Vaticano Segundo a festa foi renomeada para Nossa Senhora do Rosário. A festa tem a classificação litúrgica de memória universal e é comemorada dia 7 de outubro, aniversário da batalha. No Brasil, Nossa Senhora do Rosário é a santa padroeira de vários lugares, dentre os quais: Serra Negra e Santos, em SP; Serafina Corrêa – RS; Pirenópolis – GO; Delmiro Gouveia – AL, Russas – CE; Dois Irmãos do Buriti – MS; Paranaguá – PR; Itapitanga, Remanso e Cachoeira – BA. Monte Alegre de Goiás, a festa de Nossa Senhora do Rosário tem a mesma origem das outras cidades, diferencia-se apenas porque é comemorada no penúltimo sábado do mês de julho e celebrada na Paróquia Santo Antônio, pelo fato de Santo Antônio ser o padroeiro da cidade. O município foi fundado em 1769, com a chegada de portugueses, que traziam 1800 escravos para extrair ouro de uma grande jazida, descoberta nas proximidades do Morro do Borges, no lugarejo Santo Antônio do Morro do Chapéu. Reza a lenda que à beira do Morro do Chapéu foi encontrado o chapéu de um Bandeirante que teria sido devorado por um tigre e junto uma imagem de Santo Antônio. A festa de Nossa Senhora do Rosário, segundo a tradição Católica, em 2014 completa 276 anos. É um acontecimento bonito e atrai inúmeros turistas da região e de outros lugares. Jornalistas e repórteres de renome já a enfocaram em matérias que foram sucesso. Desenvolvimento: Festeiros, Rei e Rainha e o Capitão do Mastro. O levantamento do Mastro é feito na noite anterior, com um cortejo em louvor a Nossa Senhora do Rosário. Inicialmente, o Capitão do Mastro é buscado em sua residência. Ao sair de sua casa, leva a bandeira da Santa, acompanhado pelo toque de sanfona, com fogos de artifício e luzes de vela artesanal, feita com cera e pavio de algodão, amarrada em taboca. Ao chegar à porta da igreja, a imagem da santa é levantada no mastro, com foguetório e ao repique do sino. A seguir, é apresentada a dança da súcia, com a colaboração do povo do Kalunga, dando início ao festejo. Na casa do Capitão do Mastro é servida farofa e refrigerante. O dia seguinte, sábado é o dia mais esperado. Começa às cinco horas da manhã, com alvorada, fogos e toques do sino, acordando a cidade para o dia festivo. Primeiro, cavaleiros percorrem a cidade à caça da Rainha. Ao encontrá-la, o Rei se desloca de sua residência com o cortejo real, para a casa da Rainha. Aos sair, a Rainha entra na carruagem real começando, assim, a grande tradição. Os congos com tambores e pandeiros começam a cantar. A Rainha mais o Rei Saiam fora, que é hora da missa Vamos embora A Rainha mais é ouro só. É ouro só. É ouro só. Santo Antônio é meu Santo Nossa Senhora do Rosário Santo Antônio é meu Santo Nossa Senhora do Rosário Vamos ver o novo Rei Até pra o ano Se nós não morrer. O cortejo real segue para a igreja, acompanhado de cavaleiros, alferes da bandeira, guardião da espada. Ao chegar à igreja, primeiro é a entrada dos Congos e cavaleiros, Rei e Rainha. Ao final, a entrada da imagem da santa é acolhida pelo pároco, presidente da celebração da missa. Após a missa, tem o sorteio dos novos Reis e Capitão do Mastro. O cortejo sai da igreja direto para o local onde é servida a famosa farofa de Nossa Senhora do Rosário. Em Monte Alegre de Goiás, as despesas da festa são custeadas pelos Reis e doações, bingo, leilões, rifa e venda de camisetas com imagem da Santa e o nome dos Reis, ano e data, bem como os patrocinadores. Após a festa de Nossa Senhora do Rosário, no dia seguinte inicia-se a festa do Divino Espírito Santo, celebrada na mesma igreja com um lindo cortejo do imperador e a Imperatriz do Divino. Durante essas celebrações, a cidade de Monte Alegre é alegre mesmo. Até a década de 50, a dança da súcia era acompanhada com o tambor de rabo. Tinha também a moça de fogo, um artificio feito por João Fogueteiro. Era uma boneca em cima de um pau fincado, cheia de foguete e pólvora, que, ao ser acesa, rodava, batia os braços e os foguetes explodiam. Era uma maravilha! A população ficava encantada! Parece que este artificio só foi feito em Monte Alegre. A partir de 1958, com a morte de João Fogueteiro, a moça de fogo acabou. Nos anos 80, essa rica tradição quase foi esquecida. No entanto, graças ao empenho e dedicação de algumas pessoas, como Rosolindo Neto de Souza Vila Real, José Xavier do Bonfim e Denizar Filho, ressurgiu com grande beleza. O povo montealegrense deve agradecer a todos os voluntários que de alguma forma têm contribuído para reavivar esse símbolo da tradição. Em 2009, Rosolindo Neto de Souza Vila Real, Denizar Filho e os Reis Antonio José Filho e Danielle de Moura Cordeiro foram homenageados como Destaque, pelo Troféu Jaburu - a maior honraria cultural do Estado de Goiás. Esse reconhecimento confirma que o empenho em resgatar a cultura local, encabeçado pelo padre Luis Antônio Guimarães promete bons frutos. O prefeito, Arlon Taveira afirma que tem projetos para o desenvolvimento cultural do município. Significa, acima de tudo, que Monte Alegre de Goiás, a meu ver, está no caminho certo ao rememorar o saber, as crenças, conhecimentos e costumes do velho Chapéu de Goiás. Parabéns! (Nelli Gáspio, escritora, folclorista, pesquisadora e professora)